Os jornalistas aprendem que o mundo é opaco e as aparências enganam. Por isso estão sempre atentos para confirmar um fato, uma declaração, uma história, antes de publicar. Geralmente divulgam fatos presentes, mas não estão incólumes de serem obrigados a dar mergulhos no passado. Muitas vezes lá está a origem da reportagem que constroem. Ainda que reconstruir o passado dê muito mais trabalho que construir uma narrativa no presente, afinal, os protagonistas podem não existir mais e é necessário lançar mão de instrumentos que necessariamente os historiadores usam. Não é só por isso que a história é acessória do jornalismo. Ainda assim, as possibilidades de erros se multiplicam. É preciso humildade para reconhecê-los e humildes são aqueles que tentam suspender julgamentos açodados, antes da apuração correta dos fatos presentes ou passados. Portanto, escrever uma reportagem, ou a fusão de dois grandes bancos, ou o gari que destina o lixo para a reciclagem, é preciso planejar sempre. E isto não se faz sem o conjunto de atributos que nos fazem humanos.
O mundo do jornalismo deve ser o do ceticismo construtivo. Daí a máxima: duvide sempre. O jornalista cético é aquele que antes de decidir publicar ou não, revisa todas as premissas e se alguma não se sustentar, aborta a publicação. Para isso precisa apenas seguir a sua consciência. Aliás não se pode confiar cegamente em um especialista para construir reportagens, porque eles não sabem o que não sabem. O público prefere ter uma análise de um especialista em economia ou um jornalista que escreve sobre economia? O jornalista quando sai a campo para investigar está a procura de algo que embase a sua reportagem. Mas pode dar um encontrão com uma outra história relevante, que o acaso pôs em seu caminho. O que fazer: abandonar a velha pauta por uma nova? Há inúmeros exemplos de grandes reportagens que emergiram quando se construía uma outra planejada.
Os jornalistas não podem esconder que são atraídos e influenciados pelo sensacional. São humanos e conquistam atenção com reportagens sensacionais. Em busca de uma história eletrizante precisam cuidar para não cair no sensacionalismo e selecionar o número de informações com as quais constroem a sua narrativa. Muitas informações geram muitas hipóteses de trabalho e pode turvar o destino final. Por isso a narrativa deve ser enxuta e o excesso de ligações causais descartadas. Eventos são ignorados e depois superestimados, como dizia Stalin: “uma morte é uma tragédia, um milhão é uma estatística”. Esta é silenciosa a não ser que seja divulgada pela mídia. Um parente morto em acidente de moto impacta muito mais do que os dados da secretaria da segurança no final do mês. Jornalistas são acusados de produtores industriais de distorção. Dão ênfase a ataques terroristas mais ignoram os 13 milhões que morrem todos os anos por causa do aquecimento global, o maior assassino atual.
Por Heródoto Barbeiro
Perfil de Heródoto Barbeiro
Heródoto Barbeiro é jornalista, âncora do Jornal da Record News e do R7, diariamente as 21h. Ex-apresentador do Roda Vida da TV Cultura e do Jornal da CBN. Autor de vários livros na área de treinamento, história, jornalismo e budismo.